Em sua palestra no SXSW, há duas semanas, o prefeito de Londres, Sadiq Khan, focou seu discurso em críticas ao impacto das redes sociais e da tecnologia no mundo. Quase que prevendo o futuro do que viria uma semana depois, acusou Facebook, Twitter e YouTube de não fazer o suficiente para prevenir a distribuição de fake news, discurso de ódio e abuso em suas plataformas. ?Em última análise, deve haver maior responsabilidade de algumas empresas de tecnologia pelo impacto que estão tendo no mundo?, disse Khan, em tom de ameaça, avisando que, se não agissem com seriedade sobre essas questões, muito em breve Facebook e Twitter acabariam tendo que se submeter a regulações impostas por governos pelo mundo afora. Esse seria justamente o maior pesadelo de Mark Zuckerberg: perder o status de ser meramente uma ?plataforma? que hoje protege o Facebook de ser responsabilizado juridicamente pelo que acontece em seu quintal.
Mark e seu time de crise acharam melhor apelar para quem tem credibilidade. No mesmo dia em que fez o textão, Mark deu longa entrevista à CNN e ao The New York Times
Eis que uma semana depois, Mark viu seu mundo começar a desabar com a denúncia de um ex-funcionário da Cambridge Analytica ao jornal The Observer sobre uma das maiores violações de dados pessoais das redes sociais de que se tem notícia.
Mas a ironia de todo esse caso começa logo depois do escândalo vir à tona. Mark não tem sido nada amigável com os publishers da ?velha? mídia. Ao contrário. Em janeiro deste ano deu um duro golpe nos veículos com uma alteração de algoritmo para privilegiar os posts de amigos em detrimento dos publicados por marcas ou mídia. No Brasil, o movimento fez até com que o jornal Folha de S.Paulo decidisse deixar a plataforma. É um duelo perdido para os veículos que vinham usando o Facebook para distribuir seu conteúdo e levar audiência para seus próprios sites. Mas Mark deu de ombros às reações dos publishers. Ignorou os apelos para ser parceiro dos veículos jornalísticos, inclusive para ajudar a combater fake news em sua rede.
No entanto, a quem Mark recorreu na hora do aperto? Sim, ele fez primeiro um post tipo ?textão? no Face para dizer que estava muito preocupado com a situação. Mas com a plataforma em franco descrédito e com uma campanha massiva #deletefacebook (até o guru hightech Elon Musk já apagou as contas de Tesla e Space X), Mark e seu time de crise acharam melhor apelar para quem tem credibilidade. No mesmo dia em que fez o textão, Mark deu longa entrevista à CNN e ao The New York Times e depois para a Wired, entre outros. Repetiu sempre as mesmas mensagens-chave, para mitigar as acusações contra sua empresa. ?A Cambridge Analytica foi uma aberração?, ?o Facebook vai lidar com isso?, ?novas políticas mais duras estão em curso?. Enfim, seguiu o ritual de todo plano de crise de PR mais tradicional do universo.
E, hoje, não deixa de ser mais irônico ainda ver o anúncio com o pedido de desculpa de Mark estampado em vários grandes jornais americanos e ingleses. Não teve microtarget. Não teve mensagem personalizada para cada perfil de usuário. Teve uma nota única. No jornal. Impresso. Uau, quem diria, hein, Mark?